Toreador

Não é difícil perceber a razão pela qual se insere, aqui, uma das mais famosas árias do panorama operático --- https://www.youtube.com/watch?v=fOxDzDyLEMQ

terça-feira, 6 de novembro de 2012

DESEMBARGADORES?

 
 
Venerando Desembargador
Veneranda Desembargadora
 
 
O tratamento de Venerando e de Veneranda, que pode ler-se nesta peça, deve entender-se como resultado de mera etiqueta institucional porque, da minha parte, de modo nenhum traduz o que normalmente significa.
 
O hábito de lidar com alguns magistrados cria imunidade a patologias do foro mental. Como o psiquiatra foge a disputar com o paciente para não ser enleado pelo seu discurso febril, já que delírio não é dialéctica, assim deve comportar-se quem é castigado por algumas sentenças judiciais --- contestar quanto baste para luz de terceiros e nunca para convencer os alienados que as proferiram.
 
Se não é um caso clínico, encontramo-nos então diante de uma pérfida monstruosidade. Perturbação do juízo ou malícia, importa que fique esta interrogação: Desembargadores, vós? --- Equívoco descomunal: só por desmesurada ironia pode alguém dispensar-vos título de tamanha responsabilidade e dignidade, se acaso não sois vós que o usurpais com refinado cinismo!
 
Do vosso acórdão (para lhe dar um nome), podia ter recorrido para o Tribunal Constitucional. Mas ali, quando a questão é incómoda, os Senhores Conselheiros, com expedientes nem sempre os mais válidos, arranjam modo de não tomar conhecimento do objecto do recurso. Tinha ainda fundamento para ir até ao Supremo, requerendo fixação de jurisprudência. Porém, também aqui nada me tira da certeza de que o esforço seria vão. De resto, entre os dois acórdãos opostos, não me interessou submeter à apreciação daquele Tribunal que decidisse qual deles devia prevalecer. O melhor teria sido rifá-los: o primeiro a sair, resolveria o conflito criado!
 
Por tudo isto, achei melhor ficar quieto. Quieto perante certas instâncias que já não colhem nem o meu crédito nem o meu respeito. No mais, continuarei a reagir proclamando bem alto o mísero estado a que alguns magistrados reduziram a Justiça neste desgraçado Portugal. Denuncio o mal e provo-o as vezes que me pedirem. Só não vê isso quem foi atacado de demência, ou então os que estão possessos de ruindade e se revolvem nas chamas do ódio.
 
Entre a população portuguesa, é cada vez maior o cepticismo relativamente aos Tribunais. Venho insistindo na nota de que a sociedade está gravemente enferma. Não há mal que não mostre. No entanto, são três os principais cancros que a roem: a Comunicação Social, que tudo distorce e envenena; a Banca, fonte pródiga de corrupção; e bom número de magistrados judiciais, desse grémio que esperávamos remédio e salvação da res publica, mas onde, por desventura nossa, campeiam os que se revelam incapazes de actuar. Isto quando não procedem acintosamente contra a recta ordenação do Direito, sinal da avariose instalada numa jurisprudência que há muito virou costas à ars boni et aequi.
 
De Josué a Saul, os Juízes foram os chefes do povo eleito, dotados de grande carisma e suscitados por Deus nos momentos críticos da vida de Israel. Ao longo dos tempos e em todas as culturas, sempre foi sentida a necessidade de figuras de referência e de autoridade no governo, duas coisas que hoje escasseiam ou faltam de todo.
 
As funções daqueles heróis bíblicos não eram propriamente as mesmas que estamos habituados a ver nos modernos juízes. Mas nem só nisso se distinguem. A diferença principal reside no contraste entre uns e outros, marcado pelo valor e aceitação dos primeiros, em oposição aos últimos, os quais, salvo raras excepções, são fracos em qualidade e pouco ou já nada colhem da consideração social.
 
Senhor Desembargador e Senhora Desembargadora!
 
Cada vez fica mais a nu aquilo que sois e há muito eu sabia. Tanto despautério só pode transpirar de quem pertence a seitas ocultas, ou por qualquer outra via se acha dependente dos que adoram nas aras sacrílegas desses antros de perdição. Haveis de morrer sufocados na raiva infernal que destilais!
 
Os Tribunais já não têm poder de censura uns sobre os outros, segundo a disposição hierárquica que nos acostumámos a ver observada e que, formalmente, continua em vigor. Desde há bastante tempo que as regras são composições e arranjos, de acordo com o ditado pela obediência a uma voz discricionária, nascida nem os seus executantes sabem onde, mas que é cegamente cumprida.
 
Pertenceis ao Tribunal de uma Relação. Relação de quê ou a quê? Relação de Justiça ou aos seus princípios não será certamente, porque o pretenso acórdão que lavrastes, se não foi a mais rematada maldade, é um arremedo de jurisprudência e, como tal, não deve ser levado a sério. Talvez se situe na hipótese de farsa inoportuna a resposta que se encontra mais perto de explicar tanto desconchavo, porque não é de excluir que sejais aquilo em que, para dar título a uma das suas obras, Jean-Paul Sartre provavelmente se teria inspirado, se vos houvera conhecido.
 
Perversos ou simplesmente ineptos, não vos tenho ódio, nem vos guardo rancor. Da indignação que já senti, passei ao desprezo. É tudo o que mereceis!
 
Convosco não se pode discorrer juridicamente, porque não cultivais a ciência do Direito. Se quero crescer neste ramo do saber, bato à porta dos Oficiais de Justiça: são mais instruídos, e sobretudo tive quase sempre a felicidade de me cruzar com gente de boa fé. Fora disto, é o deserto com alguns oásis semeados aqui e além, e muitas miragens pelo meio!
 
Joaquim Maria Cymbron
 
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Obs.: Este texto tem como fundamento próximo o recurso penal que subiu ao TRC, e que foi interposto no P. 404/09.3 TARGR. O acórdão nele proferido constituiu as fls. 532 e ss. daqueles autos.
 
JMC